quinta-feira, 14 de março de 2013

Linhas



Pensando em soluções para a vida, para o mundo e para o almoço, notei que uma linha verde saia de traz de minha cabeça. Uma linha de luz verde saindo da minha nuca, deixando um rastro enquanto eu andava. Estranho eu nunca ter reparado nela, afinal era bem viva e clara, como um tubo fosforescente que cintilava e oscilava flutuante.

Olhei em volta e reparei que todos também emitiam tal linha, porém com variações de cores e intensidade. 

Continuei a andar e reparar nas pessoas e em seus tubos. Por associação consegui ligar a cor da luz com as feições nos rostos e com as palavras que por ventura eram emitidas pelos transeuntes. Pareciam diretamente ligadas. Como por exemplo o homem que estava no carro, buzinando e bravejando; sua linha variava entre um vermelho escuro e um marrom bem denso, causando certo desconforto, confesso, enquanto o via.

Vi também uma bela mulher de seios fartos emitindo uma luz amarela e laranja. Seu sorriso era evidente, enquanto contemplava os pássaros que cantavam na árvore a sua frente. Notei logo que dela também saia uma luz na altura da coluna, mais fraca, de uma tonalidade azul clara. 

É certo que não reparei logo de início, mas se tratava de uma mulher grávida. 

Já acostumado com a ideia e entendo melhor o que talvez significasse tal rastro, me surpreendi novamente quando me deparei com o cruzar de uma linha com outra.

O homem que corria pelo parque passou por outro trajado de social, causando um impacto entre os traços. Aparentemente nem um nem outro notou nada. Continuaram seus caminhos como se nada tivesse acontecido. Um sem notar a presença d’outro. Mas, prestando atenção minunciosamente no rosto do homem sério, de social, vi um esboçar de vitalidade, um rubor nas maçãs do rosto e um aumento na velocidade do caminhar.

Esse impacto me chocou, e me atentei ainda mais para possíveis colisões.

Vi um casal jovem. Dezoito, dezenove anos. “Entregues num abraço que sufoca o próprio amor”, fazendo o mundo a sua volta parar como somente os jovens sabem fazer. Suas linhas se emaranhavam em um nó desconexo, com cores vibrantes e pouco definidas. Estava tudo enrolado em volta deles e não dava pra saber onde um começava e o outro acabava.

Sim, existe a possibilidade de eu estar louco, vendo coisas. E o que mais me perturba é a serenidade que me encontro ao me deparar com essas visões completamente novas. Me sinto como Gregor, quando não questiona o por que de sua metamorfose e sim o como isso influenciará em sua vida dali por diante. Mas a loucura e a sanidade estão nos olhos de quem as julga. E se posso encarar de forma analítica tal situação, por que não contemplar o novo e me surpreender com as possibilidades?

Não quero mais ser o dono da certeza pois é do etnocentrismo a verdade absoluta do ignorante, quero analisar e não mais julgar, mas temo, pois não há dedo indicador que não aponte.